Das noites quentes de Natal para os palcos da Europa, o Taj Ma House tem transformado a cena eletrônica potiguar em um caldeirão vibrante de sons, ritmos e identidades. O projeto, formado por Janvita, Pajux, Elisa Bacche e Clara Luz, nasceu do encontro entre artistas múltiplos, todos com trajetórias sólidas na música, e que decidiram fazer da pista de dança um espaço de liberdade, ancestralidade e celebração.
Definido por eles como um live set que mistura performance, percussão ao vivo e canto, o Taj Ma House é mais do que uma banda — é um movimento. Um encontro onde o house se mistura ao brega, ao axé, à swingueira e à MPB, criando uma sonoridade que eles mesmos batizaram de “house music potiguar”.
Depois de uma turnê meteórica pela Europa e com passagem pelo Festival MADA 2025, o grupo vive um momento de amadurecimento intenso, consolidando sua identidade artística e reafirmando o poder da pista como território de afeto e expressão.
Nesta entrevista ao Bolsa de Discos, conduzida por Renan Simões, após show no festival Mada, as quatro vozes do Taj Ma House falam sobre suas origens, o processo criativo, as influências e a energia que move essa verdadeira casa sonora — um lugar onde, como diz Janvita, “a pista de dança me fez gente”.

Renan Simões (Bolsa de Discos) – Quem é Taj Ma House e quais são as suas maiores influências musicais e inspirações artísticas?
Janvita – Taj Ma House é simplesmente uma ode à pista natalense, como a minha grande amiga Pajux Frank fala em todos os nossos shows. Nada mais que isso. É a junção de muitos artistas,
cantores, multiartistas; porque hoje, ao fazer arte, a pessoa não é só isso, a pessoa é tuda. Então, é a junção desses multiartistas fazendo e celebrando a cena de house music natalense. E aí, obviamente, com as nossas inúmeras vivências e referências de música, seja da swingueira, do axé, do forró, do brega, das músicas mais eletrônicas da década de 80, house music tradicional, MPB. Taj Ma House realmente é um grande remix de muitas coisas.
Pajux – A gente procura ser um vitral: pegar essas referências, ter o nosso próprio formato e fazer com que isso vá surgindo, para criar uma pista que seja pulsante e acolhedora ao mesmo tempo. Então, é uma casa mesmo, onde a gente vai recebendo os convidados e eles saem vestindo a nossa roupa, às vezes lavam a louça (risos).
Janvita – É, acho que é isso. Esse é o Taj Ma House, né?
Pajux – Mas, explicando objetivamente, somos quatro pessoas, todas as pessoas cantam, e aí tem DJ e tem percussões ao vivo. É importante falar como é que funciona esse projeto.
Janvita – É um live set.
Pajux – O show é como se fosse um set de DJ e ao mesmo tempo é um show de banda ao vivo. São as duas coisas ao mesmo tempo, esse hibridismo.
Renan Simões (Bolsa de Discos) – Como é que vocês definem, no momento, o som de vocês?
Pajux – House… House music… Potiguar.
Renan Simões (Bolsa de Discos) – Eu ouvi o EP hoje, maravilhoso!
Pajux – É house music potiguar, house music nordestina. O house é uma cultura profunda, é uma cultura que tem muitos anos e que com um impulso muito forte de comunidades marginalizadas que criam esse som, e que decidem se divertir acima de tudo e apesar de tudo. O que a gente faz é trazer essa festividade, trazer esse impulso e esse formato junto de sons que a gente cresce ouvindo por aqui, e fazer com que isso seja cada vez mais sedutor, sabe? A gente gosta muito de groove, a gente gosta muito do swing e, ao mesmo tempo, a gente tem o prazer de ter esses elementos que vão aparecendo e que criam essa paisagem sonora que faz com que a nossa casa se pareça com o lugar onde a gente mora. É uma característica da house music: onde ela chega, ela absorve as características do lugar. Então você tem house music no mundo todo, você tem na Índia, você tem no Japão e em todos esses lugares ela absorve isso. É muito gostoso poder ter essa contribuição potiguar nordestina para esse gênero musical, que é uma coisa mundial e que existe uma comunidade mundial em torno disso também.

Renan Simões (Bolsa de Discos) – E como vocês veem que a música de vocês se insere no cenário da música eletrônica (potiguar, nacional e internacional)? (“eita” geral)
Pajux – Rapaz, olha, aqui em Natal tá tudo dominado! (risos) Eu tô falando sério. Aqui em Natal tem essa coisa de que todos nós já somos da cena há muitos anos. A DJ que começou há menos tempo é Janvita, há 10 anos. Então todo mundo já faz parte, já tá inserido nesse tecido da cena daqui há muito tempo. Clara é a novata, ela é vocalista há 20 anos, mas é a novata, pra vocês verem.
Elisa Bacche – Da música eletrônica é ela a novata.
Pajux – É a novata, mas que é uma vocalista há 20 anos, e então ela já puxa a gente pra todo esse outro lado. Fala aí, mulher, do seu lado!
Clara Luz – Ai, meu Deus! Eu tenho um trabalho de cantora e compositora há mais de 20 anos, e meu trabalho é todo calcado na pesquisa da diáspora negra. Durante um período, eu cantei muito blues, soul. Durante outro período foi muito mais música eletrônica. A gente foi puxando a música eletrônica e a gente fez um pouco de funk do Rio de Janeiro e tal. No meu último trabalho solo, que se chama Clara Luz, que é homônimo, a gente fez um trabalho muito voltado à musicalidade brasileira dos anos 80, com muita referência de Marina. Foi aí que Pajux me enxergou, porque eu encontrava ele na noite e ele fingia que não me via.
Pajux – Eu já disse que é mentira sua, eu já disse que não é assim. (risos)
Clara Luz – E aí ele e Janvita me viram. Depois de um tempo, ele foi fazer um DJ set e me chamou pra fazer uma intervenção. Janvita chegou no ensaio. Eu não conhecia ela, mas quando ela começou a cantar, eu fiquei estarrecida! Eu lembro que a gente foi pegar você, e você cantou a música no carro e eu chorei. Você lembra disso?
Janvita – Eu lembro, mulher!
Pajux – Chique lembrança!
Clara Luz – A gente fez esse ensaio nós três, e a gente sentiu que precisava de uma coisa orgânica, e aí chamamos Elisa.
Pajux – Que já vinha com uma carreira de DJ incrível. Notoriamente destaque, porque ela já fazia
percussão ao vivo nos sets.
Clara Luz – E tem uma coisa que eu quero falar de Elisa, é que a gente tá aqui em Natal, ensaiando na nossa precariedade do dia-a-dia, três microfones para quatro vozes, e Elisa ensaia com um tambor e dois bongôs. Quando ela chegou com um set de instrumentos eu olhei e falei “que porra é essa?” Boy, quando ela começou a tocar eu fiquei impressionada, sabe? Você ensaia com dois tambores e depois você tá com 15, irmão! Ela é foda, velho! Ela é foda! (risos)
Pajux – É a mulher dos mil dedos! (risos)
Janvita – É a junção de muitos artistas que se admiram na verdade, né? A gente sempre veio nesse lugar de muita responsividade ao trabalho do outro. Tipo, eu entrei na cena a partir da Houssaca, que é a festa nave mãe da house music potiguar, onde há boa parte de quem hoje é DJ aqui em Natal. É uma festa produzida por Frank [Pajux].
Pajux – Alô Mossoró! Dia 8 de novembro vai ter DJ Hunter de Mossoró, ela estará aqui tocando nos 10 anos da Houssaca! Tem que ter Mossoró!
Janvita – E é isso, velho, tipo, velho, ah, perdi meu raciocínio! (risos)
Pajux – Não é a primeira vez que isso acontece hoje! Anote também, Mossoró! (risos). Ela tá perdidinha hoje.
Janvita – Tô nada, eu me encontro em cima do palco! Mas é isso gente, é isso.
Todos – Ouçam, ouçam, ouçam, ouçam, ouçam!
Janvita – Ah, uma coisa que eu queria muito falar, e que também eu acho que seria muito legal. Estamos voltando aqui pro Festival MADA, do qual a gente participou do ano passado também, e nesse ano a gente volta com uma bagagem do caramba, depois de ter feito uma Eurotour, de ter passado por grandes experiências. Foi meteórico, acho que é um amadurecimento meteórico, é um crescimento meteórico que forçou muita gente a olhar o Taj Ma House. Por mais que no início a gente visse como um hobby que preenchesse muito a gente de paixão, hoje eu vislumbro como uma possibilidade de não viver uma vida de CLT de oito horas por dia, e eu poder me dedicar completamente à minha arte e trazer um trabalho muito melhor pra todas nós. Na verdade, todas nós podemos nos dedicar, se aprofundar. Enfim, eu acho que é muito disso. Fazendo a cabeça é uma música que fala muito sobre o quanto a gente precisa se divertir, o quanto a gente precisa de lazer, de alegria, de coisas que fazem com que a gente realmente se eleve, seja gente. A pista de dança foi o lugar onde me fiz gente, entendeu? Olha que lugar! Que lugar, né? (risos) Mas, bem, eu tô dando uma entrevista porque lançamos um disco, então quer dizer que alguma coisa funcionou, né?
Elisa Facche – E está funcionando!
Pajux – “A pista de dança me fez gente”.
Janvita – A pista de dança me fez gente, amor!
Pajux – É babado, mas é verdade.
Renan Simões (Bolsa de Discos) – Últimas perguntas: há quanto tempo o grupo existe e quais são os planos futuros?
Pajux – Três meses! (risos)
Janvita – Um ano e dez meses.
Clara Luz – Todas nós temos as nossas particularidades as nossas coisas incríveis que fazemos, mas eu acho que uma das pessoas que consegue enxergar no futuro é Frank [Pajux]. A gente tá aqui gravando o EP, pensando no EP, ele “não, mas o disco…! o disco…!”, e eu acho foda esse quebra-cabeças que ele faz.
Pajux – Meu negócio desde o começo é o disco, é a coisa de como é que a gente vai te contar essa história. Eu venho do DJ set, então pra mim, se eu tô tocando a primeira música como DJ, eu tenho as próximas horas que vão surgindo na cabeça. A gente tem muita mentalidade de DJ, e eu acho que isso ajuda muito até mesmo na hora de compor. A Elisa fala, na hora de compor, “esse batuque que vai vir aqui, porque na próxima música ele vai ter uma resposta lá”. Essa é uma mentalidade de DJ que a gente vai aplicando e eu acho que isso impulsiona muito a gente a pensar as coisas na frente. Aí, juntando o ponto que você falou com o que Javita falou agora, a gente consegue ter um pouco mais de possibilidades, e por isso que Festivais como MADA e outras oportunidades são importantes, porque o que você vai amadurecendo no palco você vai vislumbrando com o que você pode fazer, também vai se aprofundando na sua própria arte, você vai puxando as referências, você vai puxando a corda.
Janvita – Se arriscando mais também.
Pajux – Você vai dando corda a si mesmo, e isso modifica tudo, né?
Elisa Bacche – A gente deve muito disso à pista mesmo, realmente a pista fez a gente. Pontuar “caramba, isso aqui é legal”, “isso aqui acho que a gente tem que tirar, não rolou muito bem”; é uma construção que é coletiva e contínua. Então, se a gente hoje tá aqui no MADA, é porque a gente veio construindo isso e as pessoas estão gostando, e a gente tá gostando também. O importante é isso. Se você chega na nossa casa e a gente quer curtir com você, então é isso: curta, desfrute e ame o que a gente também tá amando fazer.
