Lançamento

Em caminho paralelo, não foge à linha do duo com a sua irmã, Julia, porém expande seu olhar em sonoridades transcendentais neste seu quarto trabalho solo

Por: William Robson, editor

Angus Stone é um inquieto. Uma das maiores representações indies australianas mantém um trabalho coeso com sua irmã, Julia, onde oferta inúmeros tentáculos de possibilidades ao folk. Em caminho paralelo, não foge à linha do duo, porém expande seu olhar em sonoridades transcendentais, que não dá para classificar de psicodélicas, embora igualmente lisérgicas.

E pela primeira vez, Angus dá a cara para bater. Literalmente. Até então representado por um grande limão como imagem que ilustrava as capas de seus três álbuns anteriores , em “Kimosabe” seu rosto está lá. O pseudônimo Dope Lemon adotado na carreira-solo aponta a diferenciação do seu trabalho conhecido com Júlia. E uma viagem se inicia, embarcada em um inebriante empacotamento sonoro que apreende, a priori, pelos cuidados em sua versão física.

O disco,  no formato LP, traz acabamento requintado, gatefold, revista ilustrada com imagens neo-hippies como encarte das letras e uma animação no vinil, onde um foguete se move em um ambiente espacial quando a tecla play é acionada. A imersão começa aí.

A faixa-título já entra na vibe (“De jeito nenhum, você vai foder com minha vibração”, dá a deixa na letra), com linhas de baixo sutis que, na cozinha com Leigh Fisher na bateria, criam uma superfície por onde se repete um groove da guitarra de Ben Edgar que permeia a música inteira. Por um momento, imagina-se um efeito redundante da sonoridade, até começar a compreender a real “vibração”. E, claro, entrar de vez no universo.

“Derby Raceway” fleta com o pop nesta ambiência. O folk predomina, assim como outros elementos que formatam a estrutura, tais quais sintetizadores (a cargo de Thomas Bartlett) efeitos em vocais dobrados, o baixo de Brad Heald sempre marcante (aliás, integralmente na cara, sempre presente) e meros arranjos que sutilmente explodem.

O disco esboça este efeito tranquilizador, quebrado por evoluções que demonstram a extrema habilidade de Dope Lemon, sem gerar sobressaltos.  Aliás, esta foi a sua proposta, cumprida aqui à risca. Gerar um universo sonoramente sintético, com paisagens hipnotizantes, que rompem com o que você entendia por folk até então.

“Golden God” traz esta pegada. Mas, em “Miami Baby”, o single que precedeu o lançamento do disco, tem a cara mais palatável, a porta de entrada para ouvidos ortodoxos. Se deixar o álbum seguir, cai em “Just You & Me”, ingressando de vez no torpor.

Aí, o ouvinte já está totalmente envolvido pelo “Kimosabe”, capturado pelas nuances que se reforçam no lado B. “Blue Moon Fox” inebria. A balada “Broken Down Casino” tem a presença de Sloan Peterson, nos backing vocals, uma representativa cantora australiana que em 2019  lançou o disco “Midnight Love”.

“Give me That Fire” emplaca um vocal metalizado, quase sideral, com teclados que dão dimensão de uma aventura no espaço. “Lemon Tree” fecha a viagem.

“Este álbum é tudo o que sou. No passado, a obra de arte era de certa forma anônima porque eu estava tentando explorar esses estilos, e ter esse escudo na minha frente era lindo – eu poderia me esgueirar nas sombras e não deixaria o público fazer isso”, afirmou Angus, até chegar este momento. “Nesse disco, tive momentos de clareza refletindo sobre minha infância, e pude ver onde quero estar no futuro. Então, me colocar na capa pareceu certo”. Sim, e ainda conseguiu nos levar para esta viagem.

 Cotação: ÓTIMO