No palco do Baile da Amada, durante o Festival MADA 2024, Jadsa pareceu despertar o público logo nos primeiros acordes. Era cedo, o sol ainda aquecia o gramado, e mesmo assim, a artista baiana conseguiu capturar a atenção de quem chegava — com o gingado, a firmeza e o magnetismo de quem sabe que está onde deveria estar.
Natural de Salvador, autodidata desde a infância e com uma trajetória marcada pela curiosidade e pela liberdade, Jadsa construiu uma sonoridade que flutua entre o rock, o jazz, o soul e a MPB — mas que, acima de tudo, se afirma como música brasileira contemporânea, viva e inquieta. Depois de um primeiro disco dedicado a Itamar Assumpção, Olho de Vidro (2021), ela mergulha agora em um novo momento com Big Buraco, álbum que traz maturidade e um olhar mais direto sobre o ato de estar em cena.
Nesta entrevista ao Bolsa de Discos, logo após sua apresentação em Natal, Jadsa falou sobre o início da trajetória, as influências de Salvador, a paixão por Itamar e Brittany Howard, o desafio de lançar discos na pandemia e o prazer de reencontrar o público cara a cara.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Como você descreve o início da sua trajetória musical? Quais as suas referências e experiências relacionadas a Salvador, sua terra natal?
Jadsa – Bom, eu comecei muito nova, curiosa com instrumentos, desde bebezinha tocando nas panelas, como se fosse bateria. Fui autodidata. Peguei o violão do meu pai, aprendi umas músicas e tal, e com uns 13 anos eu entrei em duas bandas. Lá em Salvador a gente fazia cover de bandas de hardcore. Em outra banda que eu tinha, a gente fazia cover de Pitty.
Quando eu fiz 18 anos, eu entrei no teatro, lá em Salvador, no Vila Velha, no qual fiquei um ano. Consegui atuar em seis peças, durante um ano. Se aprende fazendo, né? Depois do teatro, eu entendi que muita coisa não iria acontecer em Salvador. Eu tinha que ir buscar. Então, eu fui pra São Paulo, correr atrás do meu primeiro disco, que se chama Olho de vidro, que eu fiz em homenagem a Itamar Assumpção.
Isso eu gravei em 2019, e aí, em 2020, veio a pandemia. Eu ia lançar o disco na pandemia. Acabei guardando ele por um ano, lancei em 2021. Eu nunca tinha tido essa experiência de lançar um disco e fazer show, porque lancei na pandemia, fiz só o faixa a faixa, entrevistas em vídeo.
Agora que lancei o Big buraco, eu estou tendo essa oportunidade de entender como é
lançar um disco e fazer show. Lancei dia 29 de maio, vai fazer cinco meses agora. Pra mim, é uma trajetória muito intensa. Entender como é realmente você lançar um disco, fazer o show do disco, e a galera saber cantar suas músicas, você ensinar isso também, se apresentar, é outra onda.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Hoje você tinha uma tarefa árdua, que era inaugurar o palco do Baile do Amada. Logo na primeira música, parecia que você estava despertando a gente. As pessoas foram chegando ali e foram formando um público. E eu disse: “gente, isso funcionou!”. Porque era muito cedo, muita gente, um festival muito grande, com muito fã de nicho, e você capturou o público, fez com que as pessoas cantassem suas músicas, com muita segurança, desenvoltura e gingado no palco. Seu som é muito envolvente.
Renan Simões (Bolsa de Discos) – Sobre esse seu som, tem muito dessa coisa roqueira, dream pop, e muito do R&B, do soul, do jazz. Como é que você define o seu som? Quais são as suas influências?
Jadsa – É doido, porque quando eu entro no Uber com a guitarra, a galera pergunta “é um violão?”, e eu “não, é uma guitarra”. “Ah, é uma guitarra. E o que que você toca?” “Minhas músicas.” “Como são suas músicas?” E eu falo: “então, eu acho que é uma mistura de MPB com rock.” E aí eu sempre acabo na MPB, porque eu acho que é uma música popular brasileira. Tipo assim… É música de fácil acesso, que chega o refrão, você… pô, “tremedeira, tremedeira, tremi”. Certo? Tá cantando. No meio da canção, você tá cantando ela. Então, esse disco em si, eu tô definindo como MPB. Mas aí, se for puxar da minha trajetória toda, eu acho que é um jazz mesmo. É uma psicodelia jazz, assim. Uma coisa meio… Não sei, acho que tem essa mistura mesmo. Não tem como definir.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Definir sempre é uma coisa que parece que você diminui, né? Definir é limitador. Você fica limitando a coisa e parece que o seu trabalho tem tanta liberdade que às vezes dá aquele medinho. Na hora do show, teve também uma que lembrou bastante a pegada do Alabama Shakes.
Jadsa – A Brittany [Howard], eu sou louca pelo Alabama [Shakes]. Tem, sim, muita influência, principalmente pelo timbre de guitarra, timbre de voz, né? A Brittany, ela vai no agudo e vai no grave. Ela tem intenções, faz careta, tem presença de palco.
Renan Simões (Bolsa de Discos) – Esse segundo trabalho vai sair em vinil também?
Jadsa – Lógico, óbvio! Eu crio discos pra sair em vinil, pensando no disco. Foi doido porque esse disco de agora eu fiz até um pouquinho mais curto do que o primeiro, porque eu queria que ele tivesse maior qualidade sonora. Sem recortar, sem ter que ter que tirar nada.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Enquanto potiguar, eu queria saber se você curte alguma coisa daqui do Rio Grande do Norte.
Jadsa – Eu tenho uma grande amiga, que me apresentou de longe Natal, que é a Juliana Linhares. A gente fazia um show junto, ainda faz: as Sáficas. Eu, Juliana, Mahmundi, Josyara e Maria Beraldo. Então, eu sou muito fã de Juliana. Muito, muito, muito mesmo. Incrível!
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – No Mimo de Olinda, ela fez um show incrível.
Jadsa – É emocionante, né?
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Ela é muito incrível. E do Nordeste no geral, quem você poderia citar?
Jadsa – Várias pessoas, mas eu vou falar de um amigo meu, Paulo Pitta, que ainda as pessoas não conhecem, mas precisam conhecer. É um músico incrível, toca comigo, inclusive, no Big buraco. São nove pessoas. Ele faz música instrumental, é incrível, é um grande saxofonista lá de Salvador. Eu também sou muito fã do Àttooxxá, sabe? Acho que os caras fazem um movimento muito incrível. No meu disco tem participação do Chibatinha, guitarrista do Àttooxxá e tudo mais. O que mais? Duquesa, Rachel Reis, Fernando Catatau. A gente vai ter que fazer uma entrevista só pra isso.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Eu sei que esse trabalho está fresquinho, mas você acha que vai continuar nessa linha de MPB? Quais são suas perspectivas futuras?
Jadsa – Eu não acho nada. Eu não consigo achar. É tipo assim, esse show aqui foi feito para aqui, entendeu? O próximo vai ser feito pra onde for, sacou? Quando a gente tava montando a formação da banda pra cá, a minha produtora chegou assim e falou: “E aí, o que você quer na banda?” Eu falei: “velho… percussão!”. Sacou? Percussão. Eu tô indo pra um lugar que o reggae é muito vivo, que a percussão é muito viva. Eu não posso levar algo que a galera não vai ligar, sacou? Tem que ser uma percussão, aí eu meti uma percussão hoje. Então é tudo meio dedicado a esse espaço, é meio único.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – É único, né? Porque você vai sentindo e vai compondo ali, porque muda.
Jadsa – Por isso que eu falo que é um pouco do jazz também junto. Você sabe o que é aquilo na hora. Você não consegue entender o que vai ser. Então eu não consigo pensar no que é que eu vou fazer no próximo. Tem coisas que eu quero fazer, mas não sei se vão acontecer.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Eu vejo que sua trajetória acontece num momento bem complicado. Com a pandemia, você suspende as atividades um pouco e só agora que vem estrear um projeto no palco. Imagino que deve passar muita coisa na sua cabeça, de decisões a tomar. Você diria alguma coisa pra quem quer fazer música, sua arte e seu trabalho? Que tipo de mensagem você deixaria?
Jadsa – Eu digo pra galera que quer lançar alguma coisa, que quer criar, que tá desejando, uma concretização desse projeto: faça. Continue, acredite em você. Vai acreditando em você, faça.
Não olhe pra trás. Continue, meta o pé na porta mesmo, e sem medo, porque se for com medo, não vai rolar.
Myrna Barreto (Bolsa de Discos) – Isso foi muito bonito no seu trabalho de hoje, porque percebi como você estava com vontade ali, como você estava se jogando, eu acho que isso é o que cada artista talvez está buscando, se colocar.
Jadsa – Tomara que seja isso mesmo. Pra mim é uma felicidade estar em cima do palco e poder sorrir, olhar pras pessoas e tá todo mundo sorrindo de volta. É uma troca genuína, né? Eu falei até pra minha banda hoje: “parece que eu fiz mil shows em um só”. Porque pra cada pessoa que eu olhava era um show, era uma conversa de horas. Você tá aqui, é um segundo você olhando pra pessoa, mas parece uma conversa gigantesca. Eu estou muito feliz de ter feito aqui o MADA, é a primeira vez no festival, e a primeira vez do Big buraco aqui em Natal, e eu só agradeço mesmo, a vocês, ao festival e à energia daqui dos potiguares. Estou muito feliz mesmo.
