Em Pernambuco, em meio a uma plateia que lota a Igreja da Sé, no centro histórico de Olinda, o cantor Edu Lobo demonstrou toda sua musicalidade, elegância e simplicidade justificando o seu lugar de importância na música brasileira. Após uma introdução instrumental com sua banda de estrelas – Mauro Senise na flauta e saxofone, Jorge Hélder no contrabaixo, Jurim Moreira na bateria e Cristóvão Bastos no piano, direção musical e arranjos -, Edu Lobo, aos seus 82 anos de idade, demonstrou firmeza na interpretação de todas as canções, inaugurando com Vento bravo, destaque da sua produção.
O artista, com ascendência pernambucana por parte de pai e mãe, seguiu o programa com Cordão da saideira e Frevo diabo, que muito reverberam a musicalidade olindense, e com a também animada A história de Lily Braun, imortalizada por Gal Costa na trilha sonora O grande circo místico, parceria entre Edu Lobo e Chico Buarque – parceria esta que marca parte considerável dos grandes êxitos do artista. Edu apontou ser curioso cantar, em uma igreja tão bonita, uma música como Frevo diabo – e, adiciono, algo tão fogoso quanto A história de Lily Braun. Sem problemas, um Jesus crucificado estava provavelmente o observando de trás e curtindo o som.
Após esse fervo inicial, Edu Lobo nos trouxe uma dimensão mais introspectiva em três canções: Ave rara (parceria com Aldir Blanc), Noite de verão e Canto triste. Aqui, o artista nos mostra toda sua potência criativa para cantar a tristeza, passando longe de uma dramaticidade exagerada. De forma muito bonita e sincera, o cantor não conseguiu segurar o choro no final de Canto triste, admitindo ao público que há versos que, mesmo após tantos anos, ainda não foram superados emocionalmente.
A seguir, o show alterna entre músicas rápidas e lentas: Dança do corrupião (parceria com Paulo César Pinheiro), Choro bandido, Ciranda da bailarina e Pra dizer adeus (parceria de cortar o coração com Torquato Neto). Mesmo utilizando um teleprompter, Edu erra a letra da complicadíssima e conhecidíssima Ciranda da bailarina, e tira onda ao “confessar” isso ao público, aproveitando que está em uma igreja.
Silêncio, parceria póstuma com Vinicius de Moraes (a pedido da família para que musicasse essa poesia), é seguida por dois dos maiores destaques do artista, Ponteio e Beatriz, interpretadas com muito esmero e devoção. Como finalização do show, são apresentadas O trenzinho do caipira (letra de Ferreira Gullar e música de Heitor Villa-Lobos) e Na carreira. Atendendo aos pedidos de retorno da plateia, a noite foi arrematada com Corrida de jangada e Upa neguinho.
Mesmo rouco e com as vias nasais obstruídas, Edu Lobo não deixou a desejar no canto de suas melodias complexas, cheias de volteios e de grande amplitude. Entretanto, convém ressaltar que os músicos que o acompanhavam – bem como o próprio Edu – poderiam ter uma performance ainda mais orgânica e visceral se estivessem menos dependentes da leitura de partituras/cifras/letras; além disso, mesmo com a qualidade da sonorização, da equipe técnica e dos músicos, a acústica da igreja não permitiu uma qualidade sonora excelente. À parte essas considerações, foi uma noite mágica para desfrutar da arte de um dos grandes nomes da nossa música.